sexta-feira, 3 de abril de 2009

OS DESGASTES DA PREOCUPAÇÃO


Quando os meus filhos deixaram a idade em que o "comando" da situação pertence aos pais fui daqueles que, depois da fase de levar e buscar nas festas ( e como adolescentes têm festas ! ), ficava acordado até ouvir o barulho da chave girando na fechadura da porta e as minhas cachorrinhas correndo para recepcionar aquele que chegava. Como as festas eram de grupos diferentes, via o primeiro e 50% das preocupações eram dissipadas. Chegava o segundo e me entregava ao sono dos justos. Este estresse é fruto exclusivo de temperamento. Não tem nada a ver com gostar mais ou gostar menos.

A minha mulher, mãe dedicadíssima, era tão ou mais que eu ligada aos filhos. No entanto, enquanto eu ficava tentando me concentrar na leitura de alguma coisa, ou em um filme na televisão, ela dormia tranquilamente, fazendo muito bem em entregar a Deus a proteção da sua prole.

Engraçado é que a neura dos preocupados como eu, me fazia quase acreditar que a vigília a que me submetia fosse capaz de blindar os filhos da violência urbana. Tentei uma terapia familiar e a psicóloga argumentava : " Você tem que dar fé às estatísticas. Milhares e milhares de jovens saem para curtir a noite ( na época não se falava em baladas ).

Os que têm algum tipo de problema se constituem num percentual absolutamente desprezível . Só que os veículos de comunicação não vão estampar como notícia os que saíram e voltaram em paz para casa, da mesma forma que os aviões que decolaram e fizeram seus pousos sem nenhuma anormalidade jamais serão objeto de manchetes ".

Em nome da racionalidade, tive que melhorar o meu desempenho : em vez de ficar o tempo todo acordado, evolui para dar cochilos entremeados por "acordadas" para olhar o relógio. Mas era aquele sono em permanente estado de alerta, especialmente atento aos ruídos que denunciavam as chegadas.

Quando veio a época dos celulares, nem sei se melhorou ou piorou pois "atender telefonemas de papais preocupados" era um grande mico perante a turma, além do que os aparelhos estavam longe de ter a performance alcançada hoje.

Mas, como dizia aquele locutor de futebol, " o tempo passa ... " e essas preocupações ficaram como lembranças do passado. Hoje, em situações normais, já não perco o sono ( seria ridículo se perdesse ) esperando os filhos, embora um deles continue morando com a gente. O que mudou de fato para mim foi não mais me sentir de alguma forma responsável pelo que de bom ou de mal possa acontecer com eles.

Interessante é ter ouvido de um irmão do meu pai que a minha avó não dormia enquanto todos os quatro filhos ( homens, pois naquele tempo as mulheres, que eram cinco, não saiam de casa à noite ) não chegassem em casa e naquela época simplesmente não existia essa história de violência urbana.

A conclusão é que certamente herdei da minha avó paterna esse temperamento preocupado que me tirou muitas horas de sono e incomodou os meus filhos.