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Ontem me declarei fortemente influenciado por Nelson Rodrigues e alguns dos meus raríssimos leitores se manifestaram a respeito, por considerarem o jornalista, dramaturgo e teatrólogo Nelson Rodrigues uma personalidade, no mínimo, muito mal resolvida, cabendo cautela em tê-lo como um bom formador de princípios .
Olha, quem sou eu para pretender discutir, com alguma substância, a vida e a obra de Nelson Rodrigues ? sugiro a todos que leiam a sua biografia, contada esplêndidamente por Ruy Castro em O Anjo Pornográfico. Creio que dessa leitura não há quem saia pelo menos simpatizando com esse grande homem e maior intelectual, cuja vida sempre esteve marcada por tragédias.
De minha parte, devo dizer que tão logo alfabetizado, comecei a gostar de ler jornais, certamente por influência paterna. E a minha grande alegria, com sete ou oito anos, era ter um dinheirinho para comprar um jornal só para mim, novinho ...
E, nesse negócio de ler jornal, aprendi a gostar de Nelson Rodrigues, Antônio Maria, Stanislaw Ponte Preta, João Saldanha e outros articulistas da época. Quanto a Nelson, não me seduziam tanto os seus personagens e sim, muito mais, o próprio autor.
Salvo alguma peça que me pregue a memória, à época, Nelson Rodrigues produzia uma crônica diária no jornal a Última Hora, do jornalista Samuel Wainer, sob o título "A vida como ela é" . E, nessas crônicas, ele narrava a face oculta da então grande sociedade carioca, passando pelas famílias suburbanas e seguindo até a alta granfinagem. E Nelson não respeitava os falsos pudores usuais na época e contava do amor clandestino da esposa amantíssima pelo cunhado desavergonhado, do chefe de família religioso, provedor e respeitado pela comunidade e que costumava passar tardes inteiras em prostíbulos de luxo, dando asas à sua farta coletânea de extravagâncias sexuais e por aí seguia Nelson, alfinetando os padrões morais prevalecentes, colocando um facho de luz sobre as sombras de uma sociedade eminentemente conservadora. Reconheço que a leitura desses textos aos sete, oito anos, talvez tenha sido um tanto precoce, mas em minha casa a censura jamais se instalou, para o bem ou para o mal, e o meu pai achava engraçadíssima a minha prematura admiração pela leitura de jornais.
Bem poderia dizer que lia também Monteiro Lobato e os clássicos infantis, mas não vou fugir do tema central de hoje, o nosso Nelson Rodrigues e as razões que me fizeram ser dele um forte admirador e pouco talentoso influenciado.
Nelson adorava colocar o dedo nas feridas, futucar onça com vara curta, e manobrava isso com uma grande propriedade, com um fino e cáustico humor que o fazia único. Ele adorava "trafegar na contra-mão", defender com inteligência e agucidade ímpares o indefensável, se posicionar do outro lado do balcão, desafiar a manada, como sempre correndo na mesma direção.
Assim é que, embora fosse íntimo amigo de intelectuais de esquerda (lembro que ,então,"intelectual de esquerda" era bem um pleonasmo), Nelson se dizia um reacionário nato e hereditário e fazia troça do mundo socialista, então considerado o único caminho viável para a humanidade, pela quase totalidade do meio em que atuava. Só que o magnetismo pessoal de Nelson era de tal ordem que até comunistas históricos como o João Saldanha eram coniventes
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Hoje, Nelson Rodrigues é uma unânimidade ( o próprio dizia ser burra toda a unânimidade ), tido como um dos nossos maiores teatrólogos e dramaturgo de talento indiscutível. Acessar e compreender a sua obra deve ser um compromisso de todos os que se interessam em conhecer a sociedade carioca e, através dela, então um modelo seguido pelo país, em boa parte do século XX.
O melhor começo é a leitura da biografia de autoria do Ruy Castro. Assim, se parte do conhecimento do autor para o entendimento das suas personagens.