terça-feira, 14 de abril de 2009

I HAVE A DREAM ( MARTIN LUTHER KING )

Tomo emprestada a frase imortal do grande líder negro norte americano, para contar o sonho que tive ontem à noite : vivia eu num país tropical, conhecido mundialmente pelas suas riquezas, por seu clima ameno, pela total ausência de fenômenos agressivos da natureza, pelo seu magnífico litoral, pelas imensas reservas florestais ainda imaculadas, pelas suas dimensões continentais, pelas belezas naturais que Deus lhe havia conferido à abundância, enfim, um país privilegiado como nenhum outro no planeta. Mas neste país havia milhões de habitantes vivendo na miséria, ou na quase miséria, sem assistência adequada na saúde, sem escolas dignas, sem oportunidade de crescimento pessoal e material, sem infância ou uma velhice dignas. Neste país havia favelas, barracos se escorando nas encostas, crianças brincando em meio a línguas negras de esgoto a céu aberto, pessoas doentes dormindo em filas nas calçadas dos hospitais públicos, esperando pela caridade de um atendimento médico, de um exame, ou tentando conseguir um remédio que não podia comprar. Via crianças maltrapilhas na rua, pedindo esmolas em meio a reluzentes automóveis último tipo e a prédios que não fariam feio em nenhum país de primeiríssimo mundo.

E, no sonho, eu não conseguia entender a razão de haver num lugar tão abençoado em suas características, uma pobreza degradante, a inexistência para muitos do mínimo exigido pela dignidade humana. Foi quando me deparei com uma folha de papel caída no chão, onde se destacava, num idioma que me era familiar, o título :

CÓDIGO DE ÉTICA PARLAMENTAR


Considerando a necessidade de se estabelecer critérios rígidos e lastreados na decência e na dignidade que são marcas do Parlamento,

Considerando que o objetivo da atividade parlamentar é o de servir ao povo e a nação com espírito comunitário e de renúncia,

Considerando ser inadmissível que algum mau parlamentar possa usar o seu mandato para fins outros que não o patriótico dever de contribuir para o aperfeiçoamento da democracia e das leis que regem a nação,

Passam a vigorar, a partir da presente data, revogadas as disposições em contrário, o seguinte Código de Ética :

Artigo Primeiro : Fica proibida a prática de nepotismo explícito, direto ou indireto, responsáveis por expor a dignidade do Parlamento à execração da vil Imprensa ;


Parágrafo único : Empregar parentes em outras entidades do governo, ou em empresas que a ele prestam serviços, não será considerado nepotismo, pois tais contratações sempre decorrem dos excelentes curriculos apresentados pelos candidatos ;

Artigo Segundo : Não é permitido fornecer recibos referentes a propinas pagas por empreiteiras para inclusão e posterior pagamento de obras superfaturadas de seu interesse no Orçamento da União ;

Artigo Terceiro : Indicar como "testas de ferro" para as diretorias de empresas públicas, com o objetivo de achacar empresas privadas prestadoras de serviços a elas vinculadas , apenas pessoas da mais absoluta confiança e que sejam capazes de resistir a qualquer interrogatório em uma dessas "operações sei lá o quê ", que só pretendem atingir a dignidade parlamentar ;

Artigo Quarto : Jamais aceitar pagamento que não seja em espécie e entregue a domicílio, referentes a mensalinhos ou mensalões, pagos para o laborioso parlamentar votar favoravelmente a matérias de interesse do governo ;

Artigo Quinto : Não apresentar notas fiscais frias para fazer jus ao recebimento de verba indenizatória. É muito fácil ao bom parlamentar obter "notas quentes". Afinal, para que servem os amigos ? ;

Artigo Sexto : Deixar de contratar como secretária parlamentar a cozinheira ou a arrumadeira de sua residência ;

Parágrafo Único : É facultado, no entanto, pedir a um parlamentar amigo que contrate a sua amante, sendo conveniente, nesse caso, o oferecimento de reciprocidade ;

Artigo Sétimo : Em nome da honorabilidade do Parlamento, as comissões a serem pagas " lá fora" deverão ser intermediadas sómente por doleiros de ilibada reputação e dirigidas a paraísos fiscais considerados como sendo de primeira linha ;

Artigo Oitavo : Preservando a ética e a boa conduta naturalmente exigidas dos parlamentares, nenhum castelo ou palácio devem ser construídos em nome de "laranjas" que não tenham como comprovar a origem lícita dos recursos utilizados na construção ;

Artigo Nono : Não emprestar telefones celulares pertencentes ao Parlamento para parentes que estejam viajando de férias, por mais compreensivos que sejam os impulsos paternais. Afinal, o que é uma conta de dezessete mil reais para um probo parlamentar ? dinheiro de pinga ;

Artigo Décimo : Não encher os tanques de jatinhos particulares com recursos provenientes de verba indenizatória. O bom nome do Parlamento pode ser abalado por conta desse tipo de mixaria ;

Artigo Décimo Primeiro : Jamais combinar "mutretas" ao telefone, seja ele fixo ou celular. A Polícia pode estar cometendo a inominável arbitrariedade de permanecer na escuta do nobre parlamentar;

Artigo Décimo Segundo : Tomar o máximo cuidado com a ignominiosa Imprensa. Os jornalistas têm a obsessão de perseguir, de denegrir a imagem do Parlamento. Não seja vaidoso, querendo aparecer na mídia. Jornalista é mais perigoso que a AIDS ;

Artigo Décimo Terceiro : A transgressão a qualquer artigo deste Código, submeterá o infrator à Comissão de Ética da Casa a que pertence, que lhe estabelecerá a devida punição, que poderá ser trabalhar na Capital Federal numa segunda ou sexta-feira, ou, até mesmo, perder uma semana dos três meses de férias a que faz jus, além de séria admoestação, proferida num cochicho na hora do lanche .


Quando acabei de ler o papel, acordei sobressaltado, pijama ensopado de suor. Puxa, que susto ! Graças a Deus esse país só existe em maus sonhos, assim como o seu Parlamento e Código de Ética .