terça-feira, 28 de julho de 2009

ABOMINÁVEIS BRINCADEIRAS

Já contei aqui algumas brincadeiras e peças que preguei quando era jovem, quase todas em parceria com o meu amigo Francisco, um verdadeiro mestre na matéria. Hoje, muitas delas, não me atreveria a repetir , seja por conta dos meus cabelos brancos, seja por já não achar nenhuma graça em causar aborrecimentos às minhas eventuais "vítimas".

Voltemos aos primórdios dos cartões de crédito no Brasil, quando apenas a "odiosa elite" tinha acesso a eles.

Um casal de amigos, Regina ( cunhada do Francisco ) e Dálton, não chegavam a um acordo sobre ela ter um cartão de crédito. " Você perde tudo, vai perder o cartão, dizia o Dálton ". " Não vou perder nada, prometo tomar todo o cuidado, insistia a Regina ". Bem, quando a mulher quer uma coisa, haja paciência, e o Dálton acabou cedendo.

Não demorou muito e se deu a tragédia anunciada : a Regina perdeu o tal cartão ( naquela época, as pessoas perdiam as coisas, hoje, são assaltadas ).Uma perda de cartão de crédito já havia resultado em grande confusão com o pai da Regina, caso que acabou sendo objeto de discussão na Justiça. Bem, imaginem o Dálton, quando recebeu a notícia !

E, seguiu-se aquele trololó de telefonar para a administradora, cancelar o cartão, etc. Acontece que a Regina só havia percebido o extravio do tal cartão quando foi usá-lo numa loja. Não sabia, então, o dia exato da perda e, muito menos, onde poderia teria ocorrido.

O Francisco, então meu colega de trabalho, numa segunda-feira cedo, me conta o bafafá. Pronto, estava ali um caso perfeito para a nossa "atuação" . Ligo para a casa da Regina e me identifico como sendo o Sr. Alfredo, vendedor da Mesbla, alegando querer confirmar um endereço de entrega de uma geladeira. Chamaram a Dona Regina que atendeu esbaforida a ligação e foi logo dizendo, com voz de choro : " Meu senhor, eu perdi esse cartão, por favor não entregue essa geladeira em lugar nenhum " . Eu respondi: " Calma, minha senhora, eu sou só um vendedor, veio aqui uma moça, fez várias compras e sobrou só a geladeira que ela não tinha como carregar ". " Pelo amor de Deus, suspenda a entrega, vou mandar o meu marido aí imediatamente ".

Telefonema urgente para o Dálton, então um alto executivo de uma multinacional. Interrompida a reunião que ele tomava parte, face à gravidade do fato, seguiu o pobre Dálton, a galope e espumando como se tivesse tomado uns vinte Sonrisais, para a Mesbla, que ficava no centro da cidade. Chegando lá, procurou o vendedor Alfredo, quando disseram a ele que o tal do Alfredo havia acabado de sair para o almoço ( por arte do demônio, havia um vendedor de nome Alfredo ).

O Dálton ficou ali parado, esperando a volta do Alfredo e espraguejando por se ter deixado levar pela conversa da sua mulher. Quando o Sr. Alfredo finalmente chegou do almoço, palito espetado no canto da boca, como convinha a um comerciário da época, foi finalmente esclarecido o assunto : nenhuma venda, nem nenhuma geladeira para ser entregue à Dona Regina . Só podia se tratar de um trote ...

Tirando o Sr. Alfredo, que nunca soube o que foi feito dele, os demais personagens dessa história, com as graças de Deus, estão vivos e com saúde, sem nem desconfiar quem "teria sido" o "miserável" do Sr. Alfredo. Apenas o Dálton, muito inteligente, ousou dizer em uma reunião de família : " Que nisso tem o dedo do Francisco, eu tenho certeza, só não posso provar ".

******************************************

Para provar que "um dia é da caça, outro do caçador", um breve episódio passado em Buenos Aires : A Argentina e o Brasil, décadas atrás, alternavam períodos em que tudo ficava ou muito caro, ou muito barato, um diante do outro. Com a minha prima caçula Virgínia se casando com um portenho eu, que já gostava da Argentina, tinha mais uma boa razão para ir até lá. Numa dessas ocasiões em que o câmbio nos era muito desfavorável, fomos, Christina e eu, passar cinco dias em Buenos Aires. Na chegada ao hotel, deixei o voucher na recepção, sem nem me lembrar de reter a cópia que me pertencia. Os primos, aliás, é justo dizer, tenho ótimos primos, nos fartavam de programas e passeios e, o que é melhor, com total "conhecimento de causa".

Eis que, no terceiro dia da viagem, toca o telefone do meu apartamento. Era da portaria, perguntando se um rapaz poderia subir para pegar minhas bagagens. "Como", perguntei, "minha permanência aqui é de cinco, não de três dias e, aliás, já está paga". "Não", respondia o cara, "nos nossos assentamentos o senhor pagou três diárias, o hotel está lotado e vamos precisar já do seu apartamento para cumprir outra reserva". Eu, com certa dificuldade em entender a língua, já estava nervoso, me lembrando que não havia ficado com cópia do voucher. "Nada disso, paguei cinco diárias e vou ficar cinco dias" . "Negativo, o senhor pagou três diárias e vai sair já", respondia o sujeito demonstrando irritação. Aí, eu já gritava : "Não vou descer !" "Vai descer sim e o mensageiro já está subindo para pegar suas malas ! ". Seguiu-se um ridículo "Vai !", "Não Vou !", "Vai !", "Não Vou !" ( quem se lembra da canção Canto de Ossanha - Baden e Vinicius, deliciosamente interpretada pela Ellis Regina ? ) . Quando eu me punha em posição para defender os meus aposentos, já pagos, até a morte se fosse preciso, explode uma gargalhada : Era o safado do meu primo argentino, me pregando um trote, da portaria do hotel, onde havia passado para nos pegar rumo a mais um passeio.