segunda-feira, 1 de junho de 2009

TERCEIRO MANDATO DE LULA DIVIDE O PAÍS (Manchete de primeira página da Folha de São Paulo de domingo, 31 de maio de 2009)

Seguem-se, ainda na primeira página, os resultados da pesquisa Datafolha : em novembro de 2007, o mesmo levantamento indicava que 65% dos entrevistados rejeitavam o terceiro mandato, enquanto 31% o aprovavam. Já na semana passada, 47% dos que responderam à indagação eram favoráveis à alteração constitucional necessária a permitir que o presidente Lula concorra ao próximo pleito, contra 49% que resistem à idéia. Na mesma pesquisa, a avaliação do Presidente Lula lhe atribuiu 69% de "ótimo" e "bom" , 24% o consideram "regular", enquanto apenas 6%, entre os quais me incluo, o avaliam como "ruim" ou "péssimo" . Tais resultados nos conduzem a crer que logo teremos um segundo santo brasileiro.

O mesmo trabalho levantou a "intenção de voto" para presidente da República e teve duas avaliações : "com Serra", que é o que interessa, ou "com Aécio", e os resultados foram os seguintes : Serra - (PSDB) 38%, Dilma (PT) 16%, Ciro ( PSB, esse mesmo, o Gomes ) 15% e Heloísa Helena ( PSOL ) 10 %.

Longe de me pretender acreditar como um arauto da democracia, devo dizer que fiquei absolutamente desolado quando, no seu primeiro mandato, Fernando Henrique Cardoso, atribuiu ao falecido Sérgio Motta a missão nada republicana de cooptar o número de parlamentares que fossem necessários para a reforma constitucional que lhe permitiria ser reeleito. É bem verdade que quatro anos é um período muito curto para o desempenho de um mandato presidencial. O primeiro ano é consumido em assenhorear-se das grandes questões do país, enquanto o último é destinado à campanha sucessória, o que, em grande parte, coloca o presidente numa espécie de camisa de força administrativa.

Acontece que FHC não desconhecia essa limitação constitucional ao seu desempenho e, mesmo assim, se decidiu pela candidatura, certamente para aproveitar o "cavalo selado que passava à sua porta". Mas temos que reconhecer que uma alteração constitucional promovida com o propósito de beneficiar o próprio ocupante do poder é, na melhor das hipóteses, imoral. Foi imoral no governo Fernando Henrique, seria agora no governo Lula ou, ainda, será imoral em qualquer futuro governo que se pretenda democrata. Não aceito, igualmente, como justificativa, o FHC ter permanecido no governo por "apenas" dois mandatos. Na verdade, eu me concedo direito à ilação : " Quem garante que, se em pesquisa no penúltimo ano do seu segundo mandato, Fernando Henrique Cardoso estivesse com 69% de ótimo/bom, 24% de regular e apenas 6% de ruim/péssimo, o nosso eminente sociólogo não seria tentado a, docemente constrangido, permitir que, por um plebiscito, fosse decidido se a "sábia voz do povo" não lhe desejaria dar a oportunidade de completar a sua grande obra ? Vamos morrer sem saber a resposta pois, no período final do seu segundo mandato, houvesse uma tentativa nesse sentido, FHC sofreria uma derrota acachapante.

Eu espero que o presidente Lula tenha a lucidez política de perceber ( e parece que está tendo ) que a mudança de regras com o jogo em andamento, para favorecer a um player, é impensável nas grandes democracias. Não entendendo assim, o Brasil passará a ser um país em que a extensão do mandato presidencial ( e quem sabe dos demais mandatos ), será determinada em pesquisas ou plebiscitos.

Assinalo, ainda, não crer que a Folha de São Paulo esteja prestando um grande serviço à nossa democracia colocando em pauta o tema "terceiro mandato", assim como não estaria sendo nada responsável se realizasse pesquisa indagando se os entrevistados seriam ou não favoráveis ao fechamento do congresso, permitindo ao presidente da República poder governar sem as "negociações" e "pressões" a que é constantemente submetido. Por pior que seja o nosso congresso, e o é, não tenho dúvida : "Ruim com ele, pior ainda seria sem ele ... " .

Por fim, não tendo a pretensão de ser "dono da verdade" e me vendo encerrado numa inexpressiva parcela de 6% da opinião pública, não desprezo a hipótese de estar sendo vítima de uma visão "caolha" da nossa realidade. Confesso me sentir quase como a mãe do soldado que garantia estar o batalhão marchando errado, sendo o seu filho o único a marchar corretamente. A não ser que eu esteja perdendo a lucidez, o que é provável, só sei que não consigo justificar os meios que hoje vejo sendo utilizados, como sendo apenas detalhes irrelevantes, face aos objetivos maiores que estariam ( ? ) sendo alcançados . Paciência ...