quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

O FUTEBOL, CASTILHO E EU.



Sou do tempo em que se você tivesse, digamos, 40 colegas na sala de aula, sendo uns 25 garotos e 15 meninas, dos homens só uns dois ou três não gostavam de futebol. Dos demais, se sabia direitinho para que time torciam e as segundas-feiras eram consagradas às gozações sobre os "derrotados" da véspera.

O meu pai adorava futebol, era botafoguense fanático e, nessa questão, praticava o que se poderia denominar de "democracia relativa" : eu e o meu irmão teríamos liberdade para escolher os clubes dos quais nos tornaríamos torcedores . Só que, com uma ressalva: " menos Flamengo ! ". Meu irmão se transformou num vascaíno doente, talvez porque, diferente de mim, pegou o fim da década de 40, quando o Vasco tinha um timaço sendo base da seleção brasileira na época.

Já eu, com uma tendência nada prática de "torcer pelos mais fracos", fui levado ao Maracanã pelo velho, para assistir a um Fla X Flu . O tricolor, então, era chamado de timinho. O Zezé Moreira, seu técnico, não contando com grandes estrelas no elenco, mandava o time jogar fechadinho na defesa, com O Castilho ( e, na sua falta, as traves ) segurando o zero no seu placar e, quanto ao resto, fosse lá o que Deus quisesse.

Com essa tática, os jogos do Fluminense eram 0 X 0, 1 X 0, 1 X 1 ou 0 X 1. E o herói tricolor era sempre o Castilho e suas fiéis traves. Como se eu fosse jogar futebol, queria ser goleiro ( minha carreira se encerrou lá pelos cinco anos quando meu irmão bateu um penalti no estilo Quarentinha, e o courinho número 5 foi direto no meu queixo, provocando um nocaute, do qual nunca me recuperei ), comecei a torcer, primeiro pelo Castilho e, por via de consequência, pelo Fluminense.

O lazer da família, então, dividia-se entre o Maracanã, o Jockey Club, uma ou outra visita ao Parque Shangai ( ou Xangai ? ) e algumas refeições em restaurantes da cidade.

Mas o então novíssimo e ainda inacabado Maracanã tinha a nossa presença constante e no seu gramado vi jogarem grandes goleiros, mas nenhum melhor que Castilho, nem o Manga que tinha a seu lado um verdadeiro serpentuário, só com cobras do quilate de Garrincha e de Nílton Santos. Chega não é ?

Castilho esteve em quatro copas do mundo. Foi reserva de Barbosa em 50, titular em 54 ( quando fomos eliminados pelo famoso "scratch húngaro de Armando Nogueira" , com a nossa seleção levando um baile e o Castilho fazendo misérias para tomar só 4 gols ) e reserva de Gilmar em 58 e 62. Como em futebol a derrota nunca é perdoada, o Castilho pegou a injusta fama de ser um ótimo goleiro de clube, mas ruim de seleção . Na final do campeonato carioca de 1956, o Fluminense , com Castilho e tudo, perdeu de 6 X 2 para um irresistível Botafogo, com Garrincha chegando à linha de fundo e cruzando para a área, onde o "matador" Paulo Valentim só tinha o trabalho de empurrar a bola para o barbante. Naquela tarde, eu então com 10 anos, chorei muito. Por causa do Fluminense ? não, com pena do Castilho.



Já no final da década de 70, indo a Campo Grande ( MS ) a trabalho, vou tomar café da manhã no hotel, cujo restaurante estava vazio por ser ainda muito cedo. Olho para uma outra mesa ocupada e quem estava ali, só como eu, tomando café ? meu grande ídolo Carlos José de Castilho ! O meu coração acelerou, fiquei na dúvida se me dirigia a ele ou, se assim o fazendo, estaria invadindo a sua privacidade. Acabei não indo e até hoje me arrependo.

Em 1987, sou surpreendido por uma triste notícia , numa edição extraordinária de um Jornal da TV : vítima de um terrível processo depressivo, Castilho havia cometido o suicídio.

E eu chorei como se tivesse perdendo ali uma pessoa muito íntima, muito querida, meu maior ídolo de infância ...