sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

A FORÇA DA GENÉTICA


De saída, comento o quanto me causa perplexidade a forma intensa como a genética interfere nos seres humanos. A ciência, a cada dia, marcha no sentido do estudo da genética e da possibilidade de nos utilizarmos dela para a prevenção das mais diversas doenças. Mas a influência genética não se esgota nos aspectos físicos . Pelo contrário, no âmbito do psicológico, da formação da personalidade é onde mais encontramos raízes em nossos ascendentes.

No meu caso em particular, é especialmente comum eu me surpreender agindo de uma forma extremamente idêntica a do meu pai. Dele, sem nenhuma dúvida, não herdei a inteligência nem a extrema capacidade de dedicação às causas que abraçava. O meu pai foi aluno brilhante enquanto eu detestava estudar. Nesse particular nos identificamos apenas no prazer da leitura. Até aí, o nosso jogo genético permanece empatado em 1 X 1 . Na dedicação, sofro derrota fragorosa. O Jayme pai se formou em medicina pela, à época conceituadíssima, Faculdade Federal de Medicina da Bahia, aos 21 anos, após dois anos trabalhando como interno num Hospital Psiquiátrico Público. Defendeu tese de doutoramento de forma brilhante, na opinião de seus mestres, abordando a ocorrência de diversos casos de lucidez nos momentos de agonia de alienados mentais. Como se não bastasse, o meu pai aprendeu inglês com um vizinho, engenheiro britânico, que trabalhava em Salvador e viu naquele rapaz uma determinação tão grande em dominar o seu idioma, que lhe ministrou gratuitamente aulas particulares. Já o francês foi aprendido na escola e principalmente na leitura de obras clássicas da literatura francesa.

Enquanto isto, eu, rapazinho, me preocupava muito em ir à praia, jogar sinuca, bater-papo nas rodas de amigos, frequentar o Jockey Club e o Maracanã. A meu favor, só o hábito da leitura, aí incluindo os jornais e livros .

Cadê então a identidade genética ? Por esse depoimento se conclui haver existido entre mim e meu pai, isto sim, uma flagrante imcompatibilidade genética. De fato, parece verdade. Nas fases iniciais da vida éramos absolutamente distintos. Ele, dedicado aos estudos, eu, ao lazer. Na nossa vida adulta, porém, o efeito genético se fez presente e de forma avassaladora.

De que jeito ? relaciono alguns exemplos de como ele foi e eu continuo sendo :
Cumpridor de horários, amigo da rotina, sempre fiel aos lugares de que gosto, apreciador de reuniões pequenas, íntimas, meu cômodo predileto em casa é o quarto, embora meu ritmo biológico seja matutino, preservo o anonimato, transitar pelos lugares sem ser reconhecido, meus armários e escrivaninha estão sempre organizados, mantenho o hábito de ouvir rádio, não perco a oportunidade para pregar peças e ironizar a ingenuidade dos crédulos com quem me relaciono, detesto prepotentes, vaidosos e esnobes, abomino os que costumam maltratar os que lhe estão em inferioridade e bajular os que consideram poderosos e não suporto ler jornais amarfanhados.


Bem, puxando pela cabeça, encontraria mais algumas dezenas de características comuns entre mim e meu pai. O negócio é de tal ordem, que, muitas vezes frente ao espelho num gesto qualquer como pentear os cabelos, tenho a nítida impressão de estar vendo ali refletida não a minha mas a imagem do meu pai. E gosto disso.