sexta-feira, 27 de março de 2009

A SONEGAÇÃO FISCAL NO BRASIL


Sou daquele tipo que tem um verdadeiro horror a tudo que diz respeito a cifras. A simples operação de anotar nos canhotos dos cheques que o meu saldo era de tanto, aquele cheque foi emitido no dia tal, para pagar tal coisa e, por consequência, o meu saldo passava a ser de tanto, significava um terrível desafio pois meus erros e distrações me acarretavam frequentes surpresas. Tive, durante mais de duas décadas, sentada a alguns metros de mim, uma santa-secretária, a Judite, que cuidava com impecável zelo das minhas contas.

Aí mesmo que eu relaxei. Deixava a Judite maluquinha da silva, tentando checar os meus extratos bancários com os canhotos dos talões de cheques, quase sempre deixados em branco nos restaurantes, nas lojas, nos supermercados, etc. Os cheques, ainda bem, já foram quase que totalmente eliminados pelos cartões de crédito e internet. Perguntem agora se eu guardo aqueles papéis pequenininhos que nos entregam ao fazer compras. Nunca ! Resultado : quando chegam, as contas estão sempre acima do aguardado.

Reconhecendo a minha incompetência para cuidar de tudo o que se relacione a finanças, foi que conclui só poder participar de uma "pessoa jurídica" , caso tivesse um sócio da minha mais absoluta confiança e com talento para a área.

Mesmo tendo um contador à minha disposição e a santa Judite na arrumação dos papéis, todos os anos passava por um verdadeiro inferno astral na época de acertar as contas com o fisco. Perdia recibos de médicos e dentistas, não achava comprovantes de despesas com direito à dedução, uma barbaridade. E dizia ao contador, não quero correr risco de cair em "malhas" , nem ser chamado a dar explicações à Receita ( graças a Deus nunca aconteceu ) .
Quando surgiu a possibilidade de ser colocado em prática o tal do Imposto Único no Brasil ( proposta do Professor de economia da Fundação Getúlio Vargas, Marcos Cintra ), fiquei para lá de feliz. Já pensou ter uma espécie de CPMF cobrada a cada transação financeira e apresentar à Receita apenas os acréscimos patrimoniais que ocorressem, acompanhadas pelas competentes justificativas de origem legal ? isso, para pessoas com o meu perfil, é que seria o verdadeiro " paraíso fiscal " .

Hoje, continuo contando com os serviços do mesmo contador, mas a querida Judite não mais acompanha o meu dia a dia. Ainda bem que a minha Declaração de Rendimentos Pessoa Física não encerra grande complexidade.

Bem, todo esse bolodório ( como dizem os baianos da velha-guarda ) acima é por conta da manchete de primeira página de hoje, da Folha de São Paulo : Dona da Daslu é condenada e presa.

Não, não estou aqui para fazer a defesa da Sra. Eliana Tranchesi e do seu irmão Antonio Piva de Alburqueque. Aliás, digo de passagem, jamais entrei na Daslu, embora só ouça dos amigos que frequentam a loja que perco uma grande oportunidade de deitar os olhos em instalações e peças que fariam o orgulho de qualquer país do mundo. Um dia ainda vou lá "espiar" , caso a Daslu sobreviva a essa grande borrasca.

A dona da Daslu foi apenada com 94 anos de prisão, em sentença de primeira instância. Parece que por lá andaram "aprontando" um bocado, nem é o caso de querer aqui discutir o mérito da questão.

O que pretendo colocar é que a legislação tributária brasileira é da mais extensa complexidade. Mega-empresas, em grupo ou isoladamente, conseguem influir a seu favor no Legislativo. Contam, também, com a assessoria de portentosas organizações de planejamento tributário que, como não poderia deixar de ser, usam de todas as brechas possíveis para reduzir o custo tributários dos seus clientes. Mas sempre existe matéria interpretativa, ou mesmo vontade ou necessidade de "dar um drible" no Leão. Vindo a fiscalização e uma consequente autuação, entram em campo alguns não menos portentosos escritórios especializados, em defesa dessas empresas e de seus executivos.

Quando o negócio é de pequeno ou de médio porte, basta conversar, em muitos casos, com os seus donos : " ou sonego, ou fecho " . Medidas recentes de simplificação e desoneração fiscal, embora bem-vindas, não foram suficientes para alcançar grande parte dos contribuintes pessoas jurídicas. E quando contadores, economistas e advogados passam a ser o custo maior de empresas cuja atividade fim é comercial, ou industrial, ou de prestação de serviços, alguma coisa está errada.

Por isso que, mesmo sem entender nada do assunto, tenho certeza de que uma reforma Tributária bem ampla e simplificadora seria fundamental para o definitivo deslanche do Brasil.