quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Pais E Filhos : Difícil Acertar ...

Ontem escrevi no blog sobre a Revista Seleções e o meu compromentimento emocional com a mais careta de todas as publicações mundiais. Seleções sempre procurou mostrar como "deveria ser" a família americana, seu amor ao trabalho, às boas ações, a vitória do bem sobre o mal, como nos velhos filmes de cowboy ( pobres índios ! ). Depois ( 1999 ) veio o belo drama de Sam Mendes, Beleza Americana, mostrando que nem sempre as famílias americanas são exatamente como parecem . Mas isto é conversa para outro dia. Fato é que a lembrança de Seleções e do meu avô paterno, fez com que eu me lembrasse do meu pai e de alguns aspectos um tanto paradoxais da sua personalidade.

De um lado, o meu pai era um intelectual, não desses de hoje em dia, capazes até de fraudar curriculos para exibir sapiência. A leitura dos clássicos, das obras sobre educação, os grandes debates com gente do porte do Professor Anísio Teixeira e do antropólogo Darcy Ribeiro, não o inibiam a um outro lado, o de brincar com as crianças, inventando histórias, adorando vê-las lambuzadas por terra, areia, ou um bom caldo de sorvete chica-bom. A minha mãe reclamava da bagunça e ele só respondia "deixa, deixa eles ...". As velhas empregadas, também, não escapavam de conversas e considerações surrealistas. A minha babá, por exemplo, era vítima constante das invenções do velho. Quando surgiu o primeiro aparelho de televisão lá em casa, a Mimi, era esse o seu nome, já passava dos oitenta anos. Pois não é que o meu pai tanto fez, tanto fez, que conseguiu convencê-la de que, da mesma forma que os artistas eram vistos em nossa casa, eles também nos viam. Como resultado, a Mimi xingava os maus, avisava aos bons dos perigos que os ameaçavam, enfim, uma piração total. Quando um personagem bom "entrava pelo cano, o velho dizia" : " Bem que você avisou, Mimi, ele fez pouco, está aí o resultado ... "

Mas eu, fui um pai diferente e, muito pior, sem dúvida. Adorava a companhia dos meus filhos. Para mim, nada melhor que estar junto deles. Era um tal de ir ao Jardim Zoológico, Simba Safari, Play Center, Resorts, Cinema, Circo, Teatrinho, Disney World, praia, enfim, desfrutava de todo o cardapio de opções. Deixei de fazer muitas viagens, voltei no meio de algumas com saudades, é verdade. Mas, infelizmente, nunca fui de brincar com eles, falha gravíssima e que gostaria muito de reparar com os netos, só que meus filhos insistem em não me presenteá-los com eles. Eu não tinha paciência para sentar no chão, brincar de boneca, fazer comidinha, montar brinquedos, jogar bola, soltar pipas, contar histórias. Todas essas coisas que hoje, ao ver um pai fazer com seus filhos pequenos, me dá vontade de dizer para ele : " aça sempre isso pois, não o fazendo, certamente se arrependerá quando já for tarde."

Um dia, meus filhos aí pela faixa de três, quatro anos, fui com um senhor, engenheiro que trabalhava na minha área, até em casa, buscar alguma coisa. Eu morava numa rua sem saída, na Vila Olímpia, em um sobrado, e, quando chegamos, meus filhos vieram correndo me beijar. E este senhor me disse, com indisfarçável emoção : " olha, ter filhos como os seus, é uma benção de Deus. Aproveite todos os momentos que você puder com essas crianças pois, num piscar de olhos, sem que você se dê conta, eles serão adultos." Ele estava com absoluta razão e eu não imaginei que os oito anos em que moramos naquele sobrado, seriam os mais felizes da minha vida .

Enfim, fato é que, nessa matéria de ser pai, se não me coloco o céu por destino, me poupo da fogueira do inferno. Nenhum lugar me cairá mais adequado e justo que o purgatório. E, como será o purgatório ? Um lugar onde os filmes terminam cinco minutos antes do fim, os livros vem sem algumas páginas, o chope não é bem gelado, a feijoada é servida fria, todas as tardes se é obrigado a ouvir uma palestra do Senador Suplicy, sem limite de tempo, sobre a tal Renda Mínima, as mulheres provocam, mas nelas não se pode encostar as mãos, não se vê o mar, nem as florestas, apenas o asfalto ou o concreto ? Sei não, confesso a vocês, não ponho muita fé nesse tal de purgatório ...